19 setembro 2007

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Obrigado por acessarem O Cadáver
Espero que estejam gostando da minha morte!

16 setembro 2007

A porta

Não adiantou muito.
Lucky não seria tão apaixonado como Plutão. Ele continuou latindo. Depois de um tempo acabou deitando perto de um túmulo qualquer e desistiu de implicar comigo.
Meu “anjo da guarda” apesar de ser um pouco estranho com comentários até que é bem paciente e observador. Fica olhando para mim o tempo todo esperando que eu faça alguma coisa ou pergunte algo. Eu só não sabia como fazer as perguntas, mas a vontade era fazer muitas! Bem, vamos começar do princípio: de onde começam as conversas amistosas entre pessoas que acabam de se conhecer.
“Haziel” – esse é o nome do meu protetor! Ele estranhou a demora em perguntar o seu nome, mas disse à ele que sou mais estranho do que ele imagina. “Eu sei de todas as suas manias, seus desejos, seus sentimentos!” – Claro que só poderia ser assim, afinal ele é o anjo da guarda. Sabiam que este anjo, Haziel, ajuda a obter a Graça de Deus? Pois é, eu também não. Que bom que seja assim! É um Querubim que domina a bondade, queria que eu fosse advogado, mas ajudou-me na Engenharia assim mesmo. Depois de contar-me um pouco sobre ele nem me deu tempo de questionar sobre aquilo que disse à vocês... A ausência dele em momentos da minha vida viva!
Ele caminhou até o muro no fim do cemitério e fez sinal para que eu o acompanhasse. Quando cheguei até ali, ele levantou os braços e um barulho como se a terra estivesse se abrindo.
Logo pude ver uma pequena luz nascer no muro. Foi ficando maior e maior. Quando alcançou um tamanho de um homem eu pude distinguir uma porta que se abriu automaticamente. Olhei para Haziel assustado e ele sorriu.
“Não tenha medo, vou mostrar a você onde passará o princípio de sua vida eterna!”

14 setembro 2007

Lucky


Ouvi um latido familiar.

E não é que vejo Lucky vindo em minha direção?!

Ele conseguia me ver? Ah, não adianta perguntar para meu guia, pois, é como se eu estivesse sendo guiado por um cego na escuridão!
Lucky parou de repente e começou a rosnar. Tentei de toda maneira chegar mais perto, mas sem sucesso. O cachorro definitivamente estranhou-me logo que se aproximou. Meu acompanhante explicou-me que o Lucky de vez em quando aparecia no cemitério depois do meu enterro, agora que eu pude acordar de meu sono de tumba, ele não reconhece meu cheiro. Estou cheirando à assombração.
O que Plutão teria feito se Carlinhos tivesse levantado do túmulo que nem eu? Vocês conhecem Plutão, não é? Sabem do que estou falando? Não?! Ah, talvez sejam muito jovens ou não se interessem por certas vertentes da nossa literatura. Pois bem, abro uma lacuna nos relatos da minha morte para apresentar-lhes um poema que marcou minha infância:


Plutão


Negro, com os olhos em brasa,
Bom, fiel e brincalhão,
Era a alegria da casa
O corajoso Plutão.

Fortíssimo, ágil no salto,
Era o terror dos caminhos,
E duas vezes mais alto
Do que o seu dono Carlinhos.

Jamais à casa chegara
Nem a sombra de um ladrão;
Pois fazia medo a cara
Do destemido Plutão.

Dormia durante o dia,
Mas, quando a noite chegava,
Junto à porta se estendia,
Montando guarda ficava.

Porém Carlinhos, rolando
Com ele às tontas no chão,
Nunca saía chorando
Mordido pelo Plutão...

Plutão velava-lhe o sono,
Seguia-o quando acordado:
O seu pequenino dono
Era todo o seu cuidado.

Um dia caiu doente
Carlinhos... Junto ao colchão
Vivia constantemente
Triste e abatido, o Plutão.

Vieram muitos doutores,
Em vão. Toda a casa aflita,
Era uma casa de dores,
Era uma casa maldita.

Morreu Carlinhos... A um canto,
Gania e ladrava o cão;
E tinha os olhos em pranto,
Como um homem, o Plutão.

Depois, seguiu o menino,
Seguiu-o calado e sério;
Quis ter o mesmo destino:
Não saiu do cemitério.

Foram um dia à procura
Dele. E, esticado no chão,
Junto de uma sepultura,
Acharam morto o Plutão.


Olavo Bilac

Tanatologia

Sentei-me no primeiro túmulo que vi.
O anjo seguiu-me e fez o mesmo. Cruzou os braços, ajeitou-se e deu início a um relato que jamais me esqueci.

“Bem, primeiro você perdeu a consciência e depois toda a sua sensibilidade. Foi perdendo o tônus muscular; um relaxamento total... eliminou fezes e urina, seu maxilar caiu e suas pupilas dilataram... O aspecto não era dos melhores!... Aconteceu o que chamam de ‘midríase’. Todos os seus aparelhos pararam de funcionar, no outro mundo os médicos chamam de parada cárdio-respiratória! Que palavras estranhas!... Aqui nós dizemos que houve silêncio absoluto da carne... É mais poético!... Mas, enfim, você começou a ficar gelado, depois de mais ou menos três horas adquiriu rigidez cadavérica, sua barriga foi ficando verde e... depois de mais ou menos umas dezoito horas começou o processo de putrefação soltando gases e tudo mais... Sua pele foi ficando como um pergaminho, acredita?!... Como os papiros antigos! Claro que foi a desidratação que fez isso. E você também foi perdendo peso – no seu caso não foi tão difícil, já estava tão magrinho!... Mas o certo que você está dessecando rápido, rapaz!... Agora mesmo, já fazem uns três meses?!... Quase isso!... Pois é, é nessa fase em que você está que a putrefação começa a ficar liquefeita, chamam de ‘coliquativo’. Daí suas vísceras e seus tecidos mais moles já eram!... Desidrata e enruga depressa!”

O que vocês fariam diante disso, amigos vivos?
Vomitariam ou diriam – “Puxa vida, isso tudo aconteceu por quase três meses?” – Onde eu estava que não vi nada disso acontecer? E por que depois de sair da cova não pude voltar lá para ver se eu estava virando um monte de tripa podre?
Aquela figura tagarela de senso de humor que faz inveja à Lúcifer levantou-se antes que eu pudesse pensar em outra pergunta.
“Então, o que está achando da nova condição de morto?”
Caros leitores que respiram o puro ar da Terra, será mesmo que passaria meus dias ouvindo coisas absurdas desse tipo?
A única resposta que consegui proferir não expressou nem 1/3 do que estava sentindo.

“Estou impressionado!...”

Perguntas e Respostas

Que destino é esse que vive nos pregando peças?
Quem poderia imaginar que meu anjo de guarda viria ao meu encontro após minha morte?
INCRÍVEL!
Foi como disse há algumas postagens atrás: teria que se explicar em muitos episódios da minha vida em que, simplesmente, não trabalhou!
E ele continuou ali, parado olhando para mim, como se estivesse examinando minhas reações e isso me deixou muito nervoso. E essa agora. Um rapaz que nem conheço dizendo ser meu anjo fica ali olhando como se eu fosse um ET. Ele tem asas, não eu!
Naturalmente queria perguntar o que queria de mim, mas, terrivelmente tomado por um ímpeto humano da falta de controle diante de situações embaraçosas eu fiz uma grande confusão com as perguntas.
“O que aconteceu comigo?” – Meu anjo ficou olhando para mim diante daquela pergunta que, em particular, achei estranha de se fazer, mas, entendam, eu estava confuso. Constrangedor.
Sua fisionomia foi-se alterando. Começou a dar sinais de que uma gargalhada viria logo em seguida, mas fui mais atrevido. “Não ouse zombar de mim!”
Logo o moço ficou encabulado, baixou a cabeça e pediu desculpas.
“Você está morto, Maurício!”
Pergunta idiota, resposta imbecil!
Novidade. Se Deus mandou esse moço para zombar da minha cadavérica vida, pois, pode deixar-me sozinho na paz eterna. O que menos preciso agora é um espírito de porco rindo de mim.
“Por que estou aqui?” – Essa pergunta foi um pouco mais inteligente. Ninguém sabe o que há do lado de cá, então, mais do que justo eu querer saber.
“Porque você está morto!”
No momento pensei não ter ouvido direito, mas pedi para repetir e ele tornou aquela resposta.
Desisto.

O anjo

Resolvi quebrar o silêncio após a terceira chamada.
Olhei para os lados na escuridão do caixão. Interessante... Da última vez que fiz isso ainda havia um pouco de iluminação, mas talvez devido à adaptação das minhas pupilas. Com os mortos é diferente. Pelo menos foi o que pensei.
“Como faço para sair daqui?” Era a minha pergunta insistente.
Foi então que tive uma agradável surpresa. Eu já podia mover o meu corpo! Bati devagar nas laterais do caixão. Ecoou como um surdo de escola de samba. Tentei encolher as pernas e, vejam só, pude trazer os joelhos no queixo.
Espere um pouco!
Eu podia colocar os joelhos no queixo? Com qual espaço?
Tentei levantar os braços e também pude espichá-los com bastante folga. Onde estava o caixão?
“Saia, Maurício!”
Aquela voz de novo. Criei um pouco de coragem levado pela adrenalina de poder espreguiçar-me. Voltei àquela voz com outra pergunta: “Como faço para sair daqui?”
“Levante-se.”
Que resposta cretina! Eu sou um novo morto, não sei como funcionam as coisas por aqui, então seria o mínimo de educação alguém experiente orientar-me e não vir com essas respostas que parecem ser simples, mas realmente são ridículas.
Eu obedeci. Tomei mais um pouco de coragem e sentei-me, em seguida pus-me de pé. O clarão do dia dos vivos me deixou cego por instantes. Cocei os olhos e procurei em volta pelo dono da voz que estava chamando por mim.
Ele estava ali, parado em frente ao meu túmulo. Asas muito brancas e gigantes. Ao movimento que fazia elas mudavam a cor de seu brilho à luz do sol. Vestia uma túnica bege. Parecia juta ou algo parecido. A veste comprida deixava à mostra somente as pontas dos pés. Tinha um cabelo muito preto que reluzia quase em um azul profundo. Olhos vibrantes, também negros. Um sorriso quase imperceptível.
“Quem é você?” Perguntei intrigado e quase em posição de defesa, já que estava de punhos serrados, corpo um pouco curvado, pernas entreabertas.
“Sou seu anjo da guarda!