14 setembro 2007

Lucky


Ouvi um latido familiar.

E não é que vejo Lucky vindo em minha direção?!

Ele conseguia me ver? Ah, não adianta perguntar para meu guia, pois, é como se eu estivesse sendo guiado por um cego na escuridão!
Lucky parou de repente e começou a rosnar. Tentei de toda maneira chegar mais perto, mas sem sucesso. O cachorro definitivamente estranhou-me logo que se aproximou. Meu acompanhante explicou-me que o Lucky de vez em quando aparecia no cemitério depois do meu enterro, agora que eu pude acordar de meu sono de tumba, ele não reconhece meu cheiro. Estou cheirando à assombração.
O que Plutão teria feito se Carlinhos tivesse levantado do túmulo que nem eu? Vocês conhecem Plutão, não é? Sabem do que estou falando? Não?! Ah, talvez sejam muito jovens ou não se interessem por certas vertentes da nossa literatura. Pois bem, abro uma lacuna nos relatos da minha morte para apresentar-lhes um poema que marcou minha infância:


Plutão


Negro, com os olhos em brasa,
Bom, fiel e brincalhão,
Era a alegria da casa
O corajoso Plutão.

Fortíssimo, ágil no salto,
Era o terror dos caminhos,
E duas vezes mais alto
Do que o seu dono Carlinhos.

Jamais à casa chegara
Nem a sombra de um ladrão;
Pois fazia medo a cara
Do destemido Plutão.

Dormia durante o dia,
Mas, quando a noite chegava,
Junto à porta se estendia,
Montando guarda ficava.

Porém Carlinhos, rolando
Com ele às tontas no chão,
Nunca saía chorando
Mordido pelo Plutão...

Plutão velava-lhe o sono,
Seguia-o quando acordado:
O seu pequenino dono
Era todo o seu cuidado.

Um dia caiu doente
Carlinhos... Junto ao colchão
Vivia constantemente
Triste e abatido, o Plutão.

Vieram muitos doutores,
Em vão. Toda a casa aflita,
Era uma casa de dores,
Era uma casa maldita.

Morreu Carlinhos... A um canto,
Gania e ladrava o cão;
E tinha os olhos em pranto,
Como um homem, o Plutão.

Depois, seguiu o menino,
Seguiu-o calado e sério;
Quis ter o mesmo destino:
Não saiu do cemitério.

Foram um dia à procura
Dele. E, esticado no chão,
Junto de uma sepultura,
Acharam morto o Plutão.


Olavo Bilac

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